sexta-feira, 23 de maio de 2008

Devaneio sóbrio.

Duas taças de Blue Lagoo, por favor.

Susurra baixinho aquele segredo em meu ouvido. Sim, responderei contente ao que me pediste. Não importa se é certo, aliás, o certo é como a realidade. Êfemera e impalpável.

Outra bebida, a servida não é saborosa. Deixarei que o destino escolha desta vez.

Ah, como gostaria de trancafiá-la e esgotá-la em sua veloz exitência,realidade...que bonito nome tens.Quando penso em ti,já passaste. E nunca exististe. Por isto acredito ser superior nosso viver. Pois não passa. A vida sim, mas o sentir não. Carregaste a felicidade para teu presente. Foste, não será. Estiveste, não te sentirei...ficaste em Teu momento.

Vinho, quero ingerir teu sangue.

Sim, daremos as mãos. Até que o braço penda, até que os dedos se esfolem e se gastem... assim como os anos... assim como as dores dos amores... até que os suspiros sejam parte deste momento que existiu sem nunca ter sido.

Por favor, a conta. E água, estou com sede.

Carlos está na hora de ir. As horas são altas, o dia já vem. O sol goteja em nossos olhos um retrospecto fragmento do ar que respiramos. Aproveitemos o sabor do sorriso, o hálito do vento. Feche seus olhos...e aperte minhas mãos...assim mesmo, ainda na cama. Pois nada importa, nada acontece.

Agora vá. Antes que nossos corações peçam um pouco mais do calor de nossas mentes. Não há mais tempo, ande, pois isso seria demais!

Sonho:

Dá-me tua mão, Carlos,
o soar dentro de mim clama por tua direção.
Penetra em teu êxtase sublime.
Guia meu silêncio.
( ).
Não quero que ninguém saiba do segredo.
Tolos!
Suas conotações erram o caminho.
Vem Carlos, eu te guiarei.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Reflexo

Olho no espelho e vejo uma imagem refletida.
Vejo carne viva
sangro.
Olho para meu peito e nada encontro.
Retorno ao espelho.
E eu,
imagem,
desfaleço.
E a verdade se encontra
neste exato meio de ilusão.
Nele ando, amo, respiro
e me perco.

Livre Arbítrio

A morte se impõe sobre a vida. Quando sente-se a finitude do corpo, a alma fraqueja e busca um conforto intangível. E crente de que um encontro superior o confortará, abandona a existência para nunca mais ser.

Pausa.

O castigo foi recebido antes de o crime ser executado. Pura profecia.

Respirou. Fixou o olhar. Correu.

Casa azul, 21. Entrou rapidamente pela porta encostada. Disparou sua dor: uma, duas, três, quatro vezes.

Sentou a esperar. Aliviou.
Não respirou.
Aquietou.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Camila

Eu tinha quatro anos. Estava sentada no chão do quarto, desenhando e colorindo. A colcha que cobria a cama era azul com coraçõeszinhos brancos. Havia uma banqueta ao lado da cama. Como se nada tivesse importância no mundo, fiquei ali brincando sem saber o que acontecia a minha volta. Mamãe chegou à porta do quarto com aquele barrigão. Me abraçou e começou a chorar.

Ela tinha cinco anos. Era filha única, uma menina muito carinhosa, querida por todos. Dançava balé. E brincava comigo. Era minha melhor amiga. Um dia começou a sentir fortes dores de cabeça, febre que não passava. Foi levada ao hospital. Diagnóstico: meningite. Foi tudo muito rápido.

Minha mãe me tirou do chão, me abraçou e disse que a Camila não estava mais com a gente. Ela havia ido morar no céu. Não sabia o que aquilo significava, nunca havia conhecido a morte. Não sabia o que era sentir falta de alguém. Lembro que senti uma dor estranha e chorei abraçada a minha mãe. As lembranças páram por aí. Depois tudo escuresse.

...

Não sei ao certo porque isso me veio a mente, incessantemente, ontem. Estava deitada, tentando dormir, e as imagens me vieram. E não queriam ir embora. Pensei em tanta coisa. Lembrei de tantos amigos e fiquei com medo de perdê-los. Este é um medo que me assombra sempre. Ultimamente percebi que é bobeira. Os verdadeiros amigos estão ao meu lado sempre. Sinto tantas saudades de todos. A maldita rotina nos separa (sempre ela!). Mas saibam que guardo vocês em meu coração.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Saudades

Era uma varanda extensa, com um pequeno jardim à sua frente. Havia uma rua pouco movimentada que trazia um pouco de vida àquela residência tão quieta. Trazia porque os passantes estavam habituados a olhar aquela cena quase fotográfica, não fossem os suspiros de tempos em tempos vindos daquele lugar...

Ela se sentava todos os dias na mesma cadeira. Nas manhãs, tardes e noites. Após exercer mecanicamente todas as atividades diárias da casa. E todas as necessárias para que sua vida prosseguisse, até chegar a hora que Deus resolvesse levá-la.

Deus. Como ela chamava por aquele nome. Pedia diariamente para que ele colocasse um fim à sua melancolia. Mas ele a ignorava, e se esquecia dela. Passava ao seu lado sempre, levava a Maria, a Selma, a Ivone.... E se ia.

...

Lembrava da casa cheia. Das crianças correndo naquele jardim. Dos longos almoços cheios de sorrisos e altas palavras. Das visitas vindas de fora, das vizinhas amigas, dos bordados, dos bolos com café passado na hora...

Suspirava. Levantava. E limpava a lágrima que sempre teimava em cair.
 
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