Quando olho ao horizonte, não vejo mais aquelas cores que brilhavam a mim como perpétuas luzes que nunca iriam se cessar. Aquela imagem de contornos precisamente delineados, faiscados de uma alegria prolongadamente verdadeira, se apresentava diariamente à paisagem rotineira de meus dias com uma beleza doce e harmoniosa. Era assim que eu sabia olhar; esta era a sombra fresca em que eu deitava vista quando ao lado o mundo estava monocromático.
A janela extendia meu olhar à vida. Transparecia desejos tão cheios de sonhos e fantasias, ao passo das alegrias que a felicidade traz. Moldurava meus pensamentos à esperança de que ainda havia vontade, ousadia.
Mas a janela quebrou. E eu não sei viver mais. Meu corpo não pode se mover. Outras cenas não se encaixam a moldura de meu olhar que agora se delineia através de um vidro abstrato, de contornos imprecisos e imprevisíveis. A nova forma mudou a cena. E onde me encontro, neste lado de cá da rotina? Cinza, o interior da vida é cinza, e abafa a ausência de ventania externa.
A janela transita entre quem eu sou e quem eu sou?
Hoje, só, vejo. Somente hoje vejo. É assim que eu sei ver, só assim sei viver.