sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A perversão

Helena chegara em casa inquieta e angustiada. Longo o dia, de tarefas iguais, mas de pensamentos desequilibrantes. Lutara por semanas sem grande esforço, para se sentir bem com o dia de cada vez, buscando prazeres antes fugazes e saboreados agora como leves traições imaginativas. Mas tudo havia mudado como (ou pela) transição das cores no céu.

Ao entrar em seu apartamento naquele dia, ela desprezou qualquer canto e de maneira quase retilínea caminhou até seu quarto onde, enraivecida, retirou as roupas como se mal houvesse nelas que expusesse seu corpo a uma enfermidade.

Deitou na cama fria e sentiu o calor gélido subir por seu corpo. Chorou estranhamente um choro desconhecido ou esquecido, como aqueles em que se chora na barriga da mãe. Sentiu se esvair o labirinto de seu sossego, viu um desconserto nascer já em clímax e definhar a gotas leves.

Era a loucura, sorriu Helena em entendimento de ser, não de existência. Revolveu-se nos lençóis, esticou o corpo, pensou ser o melhor, imaginou a morte de quem amava em uma longa noite de amor com uma vadia qualquer.

Enquanto o corpo esquentava por tantos movimentos, Helena foi se aquietando e voltando a ser aquela velha conhecida e materializada quando pronunciado seu nome em referência: Helena.

Levantou-se da cama, foi ao banheiro onde lavou o rosto, não retirando por completo a negra cor pintada em seus cílios. Viu a água escura escorrer por sua face, sulcando aquela pele alva, de uma mentira tão amiga daquele olhar. Fixou-se no espelho e sorriu divertida ao ver a cena. Helena. Aquela velha conhecida.
 
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Degustação Literária by Fernanda Fernandes Fontes is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 2.5 Brasil License.